sexta-feira, 17 de julho de 2009

Jovens ingerem 50% do cálcio necessário

Estudos em várias cidades mostram que adolescentes têm déficit do nutriente; carência pode acelerar osteoporose

A falta de cálcio é uma das principais preocupações em saúde alimentar nessa fase, ao lado da carência de ferro e do excesso de calorias

JULLIANE SILVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL PARA A FOLHA DE SÃO PAULO

Estudos em diferentes cidades do Brasil mostram que os adolescentes consomem só metade do valor de cálcio recomendado por dia. Um dos trabalhos, feito com dados de 206 adolescentes de Indaiatuba (SP) e apresentado como tese de doutorado na USP, aponta que o consumo médio do nutriente é de 680 mg diários -o indicado são 1.300 mg. O estudo será publicado no "Journal of Adolescent Health".
Uma outra pesquisa, que englobou dados de 1.250 adolescentes de escolas públicas de cinco cidades -Campinas, Piracicaba e Piedade (SP), Toledo (PR) e Seropédica (RJ)- , também aponta o mesmo déficit no consumo de cálcio. "A grande preocupação é que os problemas não surgem agora. Mas daqui a dez ou 20 anos teremos adultos jovens com osteoporose", diz a nutricionista Rozane Bleil, responsável pelo levantamento de dados em Toledo.
As causas para a deficiência são a substituição dos laticínios -principais fontes de cálcio- por refrigerantes e sucos artificiais e a falta do café da manhã, quando a ingestão de laticínios é mais comum. "Nessa fase, as pessoas dormem mais e almoçam direto. Ou, então, acordam atrasadas e comem na escola alimentos menos saudáveis", analisa a nutricionista Bárbara Peters, responsável pelo estudo da USP e pesquisadora do Ambulatório de Fragilidades Ósseas da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
Entre os adolescentes avaliados por Peters, os que tomavam café da manhã apresentaram as menores deficiências.
Para o hebiatra Benito Lourenço, do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas de São Paulo, a falta de cálcio é uma das principais preocupações em saúde alimentar do adolescente, ao lado da carência de ferro e da ingestão excessiva de calorias. "Nosso problema é garantir que a deposição de cálcio ocorra de maneira perfeita nessa fase, período de maior incorporação nos ossos", diz.
É na adolescência que se forma boa parte do volume dos ossos para toda a vida -o pico de massa óssea ocorre entre os 20 e os 30 anos. Uma dieta deficiente em cálcio contribui para um pico mais baixo e aumenta as chances de o indivíduo desenvolver osteoporose.
"A população está envelhecendo, e estamos chegando à terceira idade piores. Acho que haverá casos mais precoces de osteoporose, especialmente mulheres com qualidade óssea muito ruim na menopausa, porque tiveram uma adolescência malcuidada em termos alimentares", alerta a endocrinologista Marise Castro, chefe do Setor de Doenças Osteometabólicas da Unifesp.

Outras deficiências
O trabalho da USP também constatou baixos níveis de vitamina D no sangue dos adolescentes. Esse nutriente tem a função de fixar o cálcio ingerido nos ossos, o que agrava ainda mais a carência do mineral. "Isso tem sido observado. Fizemos um trabalho com 120 trabalhadores jovens e estudantes de medicina; 20% tinham deficiência grave de vitamina D e 40% estavam abaixo do valor saudável", acrescenta Castro.
A deficiência é atribuída, pelos pesquisadores, à falta de sol, já que a maior parte da vitamina é sintetizada pelo organismo com a ajuda da luz solar.
O trabalho nas cinco cidades ainda constatou baixa ingestão de vitamina A e de fibras. "É imprescindível o estímulo ao consumo de frutas e hortaliças. Ele é muito reduzido, mesmo em famílias com maiores rendimentos. Assim, seriam consumidos juntos cálcio, vitaminas e fibras", diz Marina Vieira da Silva, professora da Esalq (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz), da USP, e coordenadora do estudo.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

Óleo de palma substitui gordura trans

Presente em muitos alimentos industrializados, composto aumenta colesterol ruim e prejudica saúde cardiovascular

Para especialista, indústria está "trocando um ingrediente que é duas vezes ruim [trans] por um que é uma vez só"


JULLIANE SILVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Mesmo com menos gordura trans, alimentos industrializados ainda têm altos teores de gorduras saturadas -também danosas à saúde cardiovascular porque aumentam os níveis de LDL (colesterol ruim) no sangue. É o que aponta estudo feito na Unidade de Lípides do InCor e na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP.
O responsável é o óleo de palma, que confere características semelhantes às da gordura trans em alimentos, como textura crocante e maior durabilidade. Ele tem sido usado no Brasil como substituto da trans, após a decisão do Ministério da Saúde de obrigar a indústria a reduzir a quantidade desse tipo de gordura nos produtos. E já é largamente utilizado em outras partes do mundo onde a gordura trans foi banida.
No trabalho, publicado na última edição da "Revista da Associação Médica Brasileira", foram avaliados margarinas, biscoitos doces recheados, biscoitos salgados, batatas fritas e hambúrgueres.
"Esperávamos uma quantidade razoável de gordura saturada no hambúrguer porque ele tem carne. Mas nos surpreendemos muito com os outros produtos, que continham pouca trans, mas muita gordura saturada, que vinha do óleo de palma", afirma Ana Carolina Gagliardi, nutricionista e doutoranda em cardiologia pela Faculdade de Medicina da USP, responsável pelo estudo.
A batata frita e os biscoitos salgados e doces foram os que apresentaram a maior proporção de gorduras saturadas.
De acordo com Jane Show, engenheira de alimentos do Ital (Instituto de Tecnologia de Alimentos) e presidente da Sociedade Brasileira de Ciência e Tecnologia de Alimentos, as empresas têm diminuído os níveis de gordura trans de seus produtos. Em dezembro de 2008, o Ministério da Saúde e a indústria de alimentos definiram que a gordura trans deve ser reduzida até 2010.
"O consumidor não quer mais comprar produtos com trans. As indústrias passaram a usar o óleo de palma, que tem valores altos de gordura saturada. Não se proíbe o uso de gordura saturada, mas tem de estar declarada no rótulo", diz.

"Esquecidas"
Para Gagliardi, as gorduras saturadas ficaram "esquecidas" diante da preocupação com a do tipo trans. "O efeito deletério é similar. Alguns trabalhos dizem que não, mas os que falam bem do óleo de palma foram feitos em animais ou patrocinados por fabricantes. Pesquisas mais sérias apontam riscos parecidos", acrescenta.
Para outros especialistas, a gordura trans, além de aumentar o LDL sanguíneo, também reduz os níveis de HDL (colesterol bom) e, por isso, é mais perigosa do que as saturadas.
"Os produtos ficaram melhores, mas não é por isso que podemos comer à vontade. Deve-se ler o rótulo, saber que ainda são ricos em gorduras. Estão trocando um ingrediente que é duas vezes ruim por um que é uma vez só", diz a nutricionista Camila Gracia, do Setor de Nutrição Preventiva do HCor.
A Folha procurou a Abia (Associação Brasileira da Indústria Alimentícia) para comentar a pesquisa, mas não obteve resposta até o fechamento desta edição.

Fonte:

Folha de São Paulo, quinta-feira, 2 de julho de 2009 (só para assinantes)